
XXI
Concentro os olhos no mais precário
lugar do teu corpo: morre-se
em agosto com as aves:
de solidão.
Neste instante sou imortal:
tenho os teus braços em redor
do corpo todo:
as areias escaldam: é meio-dia.
Do teu peito avista-se o mar
caindo a prumo:
morre-se em agosto na tua boca:
com as aves.
Eugénio de Andrade, branco no branco
CIDADE
Meti-me por setembro fora, a caminho do
fulgor das maçãs, deixando para trás os
bruscos golfos da tristeza e uma luz de neve
quebrada de vidraça em vidraça.
Contemplava a cidade das pontes pela
última vez, envolvida por lençóis encardidos
e uma névoa que subia do rio para lhe mor-
der o coração de pedra.
Era um burgo pobre, sujo, reles até - mas
gostaria tanto de lhe pôr um diadema na
cabeça.
Eugénio de Andrade, memória doutro rio
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