domingo, 28 de março de 2010

Há ‘polvos’ na Igreja?

O polvo é um ser curioso. Vive no oceano escuro, sozinho, isolado da luz solar, quase como se não dependesse dos bens terrenos, associando- -se facilmente à ideologia e ao estilo de vida de monges eremitas. Mas de igual forma se pode inversamente relacionar com a corrupção da Igreja: os seus oito tentáculos são símbolo da ambição desmedida (pode ser curiosamente referido pela expressão “Tens mãos para tudo isso?”), como já foi usado muitas vezes, por exemplo, em cartazes de propaganda anti-comunista ou anti-capitalista. Isto mostra que, embora o polvo seja um ser inteligente, a sua inteligência está sempre num pedestal pejorativo, indicando um esquema ou artimanha secreta (ou seja, é também símbolo do medo do desconhecido, o terror do exterior). Ora esta inteligência, aliada ao corpo moldável do ‘polvo’, que se traduz na capacidade de fugir a situações que, para outros seres menos “flexíveis”, significaria o cárcere associado a um poder “garantido” da Igreja, provoca uma possibilidade: a de poder comer a maçã. Como sempre se verificou, a possibilidade, neste mundo, justifica a causa, nobre ou injusta. E assim manteve-se esta rotina, até ocorrer a Contra-Reforma da Igreja e o luxo do ouro é acompanhado pelos Sermões assertivos, o Índex e o Tribunal da Santa (!) Inquisição. Este comportamento de mutação, comparativo da maleabilidade do ‘polvo’, mostra que a vantagem surge sempre do inesperado, neste caso, dos traços analíticos de sociologia muito avançada por parte da Igreja. Isto só prova que em tempos de crise a Igreja Católica adopta a inteligência e um funcionamento semelhante ao de uma empresa que “aperta” mais os funcionários com restrições e cortes de ordenados. E foi contra este modelo empresarial da Igreja que muitos católicos se revoltaram (como Padre António Vieira).
A situação em “Breve Sumário da História de Deus” é em tudo idêntica ao referido. Quando Satanás se disfarça de monge eremita, o encenador quer passar a ideia ao espectador de que o “hábito” não concede o título (não faz o monge) à entidade que o traja e, neste caso, é representada também uma aproximação à atitude de Cristo perante a oferta de Satanás, que é, por excelência, o exemplo mais perfeito a seguir. Basicamente, quer deixar-nos a pensar para aprendermos um pouco sobre a condição humana. Afinal, essa é a função principal do teatro!
Harpagão, por sua vez, em “O Avarento”, sob o meu ponto de vista, exibe uma “mortalha” de alguém que morreu em termos psicológicos (como Manuel de Sousa e D. Madalena em “Frei Luís de Sousa”). Porque, como não é perfeito e está sujeito a todas as impurezas de ser humano, deixa-se corromper e privilegia um defeito: a ganância. Quem somos nós para julgar Harpagão; em tudo o achamos desprezível, mas no fundo nunca o conhecemos. Talvez a sua ‘vida’ tivesse ficado no seu passado…
Em todo o caso, estas fábulas de sonho, estruturais de todo o mundo, acabam por ser nada mais que uma aula. Como as que temos todos os dias. Todos os dias em que o sol nos roça na cara e pede que acordemos. Só temos de acordar e aprender. Se há uma coisa que eu julgo que aprendi é que a educação é a única forma de melhorar o mundo e torná-lo mais justo, para que injustiças como as que mancham os livros de ‘história’ não voltem a acontecer. Façamos jus a toda a gente que nos fez ver mais longe. Sejamos humanos outra vez!

Gabriel António, nº8, 11ºE

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