domingo, 29 de março de 2009

Londres de Sol a Sol



A bruma da manhã paira ao Sol enquanto a cidade acorda.
Os Londrinos movem-se, sempre apressados, de malas na mão e telemóveis ao ouvido; a maior parte deles são estrangeiros vindos da Índia, China, Japão, entre outros países asiáticos, de terras do sul de África, da América do Sul e de outras partes da Europa. As poucas pessoas de ascendência inglesa são quase sempre loiras, altas e de olhos claros, predominantemente azuis; têm ombros largos e passo rápido. Movem-se ordenadamente, não se intrometendo nos caminhos dos outros sete milhões de habitantes de Londres.
As maiores artérias da cidade são as linhas do metro, estas situam-se principalmente sob o solo, facto surpreendente numa tão grande metrópole, mas que se deve a ter sido o Reino Unido um dos pioneiros na evolução dos caminhos-de-ferro. Como os próprios cidadãos o metro (ou Underground como lhe chamam) é rápido e prático, arranca subitamente produzindo um enorme solavanco que logo distingue os nativos dos turistas (tome-se a senhora de livro e saco na mão que como um mastro se aguenta quase sem vacilar, e os grupos de malas às costas que quase caem aos montes). A voz quase mecanizada pela repetição dos altifalantes alerta para a brecha entre as carruagens e as plataformas, as portas abrem e cerram numa maré sempre viva de multidões.
Ao contrário do nosso pequeno Portugal (levantem-se em sua “defesa” os quarenta anos de ditadura e o seu lento despertar) na cidade de Sherlock Holmes os autocarros são todos gémeos: vermelhos como maçãs maduras os double-deckers e os seus primos de menos um andar movem-se na tentativa de satisfazer a horda na luta contra o relógio. Os táxis negros e de formas arredondadas cruzam as ruas. Como todos os veículos, têm o volante à direita e conduzem à esquerda (o que é um paradoxo com as placas presentes nas escadas rolantes das estações de metro: “stand on the right”, mantenha-se à direita).
Os relógios, existentes em quase todas as ruas, como que relembrando aos habitantes a razão da sua eterna pressa, marcam o meio-dia, mas o nevoeiro persiste. Sem nunca abrandar o passo, homens de fato e gravata e mulheres, não menos bem vestidas, compram sandes nas lojas que abundam nas ruas. Com a graça da prática ingerem o seu pouco nutritivo almoço sem deixar nódoas no vestuário. Os turistas concentram-se nas lojas de recordações, cujos donos são na sua maioria também estrangeiros.
Londres tem muitos locais a visitar. Não se espera menos de uma cidade com cento e trinta e dois museus. De lados opostos do Tamisa, olham-se o London Eye, celebrando o novo milénio, e o Big Ben com o Parlamento. Os últimos foram construídos ao longo dos séculos, sendo o seu estilo o equivalente ao que vemos no Mosteiro da Batalha; no entanto, enquanto que a obra portuguesa (de glória equiparável à inglesa, senão maior) deixa que o tempo desgaste o seu calcário, a anglo-saxã continua a elevar-se orgulhosa.
O tinir grave do enorme sino de catorze toneladas do Big Ben ressoa sobre as águas do rio, o ponteiro de quatro metros e vinte e cinco move-se com os minutos e o das horas, com metade do tamanho, acompanha-o na representação mecanizada da pontualidade inglesa.
A culinária não é o forte deste país antigo, algo bem visível na quantidade de crianças obesas. Parecem desconhecer o arroz e que fritar não é a única forma de cozinhar batatas. O chá das cinco deu lugar às sandes no palco da actualidade e os McDonalds surgem nas esquinas como ervas daninhas.
Para quem conhece o Convento de Mafra, sugiro-lhe que imagine algo igual em tamanho, mas de fachada talhada com criaturas antigas, grandes portadas e entrada livre. Se encher o seu interior de testemunhos de eras passadas, tanto provas outrora vivas como para sempre petrificadas, terá o Museu de História Natural.
Tanto este museu como o Britânico contêm tesouros de outros países, muitos deles roubados, o único defeito destes museus com qualidade, uma raridade em Portugal.
O Sol desce sobre o horizonte, os seus raios iluminando os edifícios, quase todos com menos de cinco andares, e reflectindo-se nos vidros espelhados das novas construções que se erguem altas, destoando dos outros prédios modestos. O final do dia de trabalho não parece exercer qualquer paz sobre o trânsito, que mal se ouve (porque parecem não existir buzinas em Londres), e a corrida é agora no sentido inverso, em direcção aos lares.
Mas cidade que é cidade, não dorme. A noite traz consigo outro ambiente: o ar fica mais frio, mas os rostos mais alegres e descontraídos, as pessoas passeiam pelas ruas largas e limpas (algo espantoso tendo em conta a falta de contentores e caixotes para lixo, devido às ameaças de bomba).
Assim se juntam os habitantes aos turistas, num passo mais calmo como se a adrenalina que fez o coração da cidade pulsar ritmadamente se tivesse esgotado. Os autocarros, metros e táxis continuam a cruzar as ruas, mas agora há gente sentada nas fontes e nos inúmeros parques.
Como sempre, a Lua persegue o Sol começando um novo dia, uma nova corrida em Londres, uma cidade viva.

15 de Março de 2009

Texto e fotografias de:
Ana Inês Proença Pinto, nº2, 10ºG

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