domingo, 24 de agosto de 2008

Mapas para nos perdermos

Joseph Cornell
Objecto, 1942

MAPA

Ouço-as por dentro de mim, metidas nos cantos da memória,
comendo as madeixas do verso em silêncio; e amo-as, num
sussurro fresco de ser, deixando-as alimentarem-se dos meus
próprios restos - ó respirações hesitantes do sonho, prometidas
ao destino de uma palidez absurda, nuas no dorso das dunas!...
Mas afasto-as da minha vida, no quarto fechado das margens
nocturnas. Os meus dedos tocam-nas na instrumentação dos
sons; sei que as cuspo com o luminoso rasto de uma queda de
estrelas - e, no entanto, não cessa o desejo de uma floração
matinal de lábios!, nem os outonos, presos numa concha de
amêndoa, me recusam o estímulo de mares navegáveis! (Traçai,
então, o contorno preciso das ruínas solares da página).

Nuno Júdice

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